O Patriarcado da Miséria e as Mulheres como Fábricas de bebês
A MATERNIDADE :UM EMPREENDIMENTO CAPITALISTA
A MATERNIDADE :UM EMPREENDIMENTO CAPITALISTA
As ideologias do “eterno feminino” e do “sonho da maternidade” existem e são perpetuadas na sociedade patriarcal para que as fêmeas de nossa espécie (junto com os demais grupos oprimidos) possam dar aos machos brancos da burguesia as condições materiais necessárias capazes de projetar sobre o mundo exterior os valores e as representações da dominação masculina.
Como já foi dito por nós Maçãs Podres, a humanidade se expressa e faz no seguinte axioma: “existo, logo trabalho; trabalho, logo penso; penso, logo sou” e assim quando nós mulheres acreditamos em quaisquer uma das ideologias que diferenciam os sexos, significa que acreditamos também na desigualdade social, econômica e étnico/racial. Ao propagarem ideologicamente a manutenção do sistema patriarcal, os machos propagam juntamente com ela a ideologia do controle material e econômico surgido a partir das relações produtivas que se desenvolveram historicamente e geraram a deformação fundamental que estabeleceu os machos como donos de mais 99% dos grandes meios de produção¹.
Mas para que possamos compreender a relação direta entre o sistema patriarcal e o sistema capitalista, analisamos qual é a relação entre a ideologia da maternidade e a sua importância para conservação das relações da desigualdade econômica.
Mas para que possamos compreender a relação direta entre o sistema patriarcal e o sistema capitalista, analisamos qual é a relação entre a ideologia da maternidade e a sua importância para conservação das relações da desigualdade econômica.
A EXCLUSÃO DAS MULHERES É A EXCLUSÃO DO MUNDO
Com o desenvolvimento da humanidade (chegando à atual fase econômica do patriarcado - o capitalismo), a manutenção das condições materiais originou diferentes tipos de trabalho. Estes diferentes tipos de trabalho exigiram diferentes níveis de educação e qualificação, fazendo-se necessária uma grande quantidade de pessoas para que todas as atividades possam ser executadas. Da mesma maneira que a educação e o acesso ao conhecimento foram restritos e distintos entre homens e mulheres, a educação e o conhecimento também seguiram a mesma lógica entre as diferentes classes sociais para que assim os privilégios das classes dominantes pudessem ser garantidos sem grandes contestações.Tal fato ocorreu para que todas as funções que sustentam a desigualdade social fossem preenchidas, pois se todas as pessoas tivessem acesso aos mesmos níveis de conhecimento, certas atividades degradantes não teriam quem disponibiliza-se para executadas. Com o passar do tempo, foi através dos salários pagos aos empregados que esta diferenciação se manteve possível. Para a satisfação das necessidades do mercado de trabalho, as diferenciações salariais produziram diferentes níveis de especialização e trabalhadores, todos prontos para vender a única coisa que lhes pertencia: a mão de obra. Assim como na intenção de se manter os privilégios e a desigualdade entre as diferentes classes sexuais, restringindo as possibilidades e potencialidades das pessoas/fêmeas, o desenvolvimento econômico do sistema patriarcal se fez a partir da necessidade de produzir uma imensa variedade de força de trabalho capaz de garantir a sobrevivência humana dentro das condições sociais impostas após o Matriarcado (Comunismo Primitivo). Logo, a lógica da desigualdade de classe sexual se impôs, reproduzindo a mesma lógica da desigualdade do sistema econômico capitalista. E o que nós feministas temos haver com isso?
A MATERNIDADE COMO FÁBRICA DO CAPITAL
Primeiro, é do ventre feminino que surge a futura mão-de-obra a ser explorada pelo capitalista. Ou seja, no capitalismo “a responsabilidade das mulheres” com a continuidade humana é a responsabilidade com “a produção das futuras gerações” que assumirão os postos de emprego desocupados pelo desgaste dos trabalhadores explorados. Graças às restrições citadas acima, a “maternidade intensiva²” acaba por contribuir formalmente para a exploração e conservação da desigualdade social, pois tanto no capitalismo quanto no patriarcado a obrigação das mulheres com a “maternidade” é “uma obrigação feminina com a continuidade das desigualdades econômicas de nossa espécie”. Por exemplo, em condições de completa miséria, toda vez que crianças vendem nos faróis os produtos da Indústria de Chicletes Adams, a empresa lucra com a manutenção de sua marca. Devido ao “sonho da maternidade”, a genitora destas crianças fornece para a burguesia parte da mão-de-obra não especializada que garante a circulação destes produtos sem que existam custos formais para que o fato ocorra.
Segundo, na maternidade as fêmeas tornam-se mais facilmente presas ao trabalho doméstico, ou seja, são afastadas do trabalho transformador que projeta sobre o mundo e sobre a humanidade os valores materiais da vida social. Isso faz com que nos tornemos um exército de reserva que só é aproveitado em momentos de guerra e catástrofes, comprovando o quanto as mulheres são "inessenciais" fora dos círculos de trabalho que compõem a reprodução humana. A conseqüência psicossocial deste fato é que a falsa naturalização da desigualdade sexual (fêmeas como reprodutoras da vida, machos como criadores das condições materiais) serve de falsa justificativa para a naturalização das desigualdades econômicas. Com o trabalho doméstico quase que exclusivamente destinado as fêmeas de nossa espécie, surgiram às falácias da aptidão “natural das mulheres” aos exaustivos trabalhos do lar, que em um âmbito maior expressam também “a natural aptidão” das classes dominadas ao exaustivo trabalho braçal. Quando restritas ao ambiente doméstico, nossas possibilidades de transformação humana tornam-se diminutas, nossa existência privada é facilmente apagada da história e nossa atuação individual projeta-se como inessencial para a sociedade. Um exemplo é o da imagem tirada na Igreja da Sé de Olinda (mostrada ao lado deste texto) que comprova o axioma das Maçãs Podres. A “inexistência” de tal mulher se deu pelo fato de que o “único” trabalho desenvolvido por ela (ser esposa de um verme e perpetuar o sobre nome dele) tornou-a invisível para o mundo.
Terceiro, assim como o capitalista projeta o seu poder e status social a partir do controle privado da fábrica, da fazenda e dos outros meio de produção, o macho projeta o seu poder e status sexual a partir da propriedade que ele acredita possuir sobre o ventre/corpo feminino. Por motivos similares, o capitalista diz deter o domínio sobre o produto fabricado pelos trabalhadores nos campos e indústrias, graças a legalidade institucional que lhe dá direito de uma propriedade privada, assim como os machos projetaram em si “a propriedade e o direito do controle familiar (esposa/crianças)” no reconhecimento social da sua paternidade/matrimônio. Tanto que a naturalização do “papel de provedor da família”, estabelece entre homens e mulher a mesma relação patronal existente nas relações capitalistas, quando dona de casa cabe a mulher exercer as atividades de cuidado do lar e educação infantil para descanso do “chefe da casa”. Como dono da casa, da mulher e dos filhos, seu ócio se faz garantido na medida em que o mesmo, garante sua liberdade a partir do controle social que exerce (poder opressor) sobre os corpos alheios (esposa e filhos), já que estes não podem se sustentar sem o “produto” de seu trabalho, assim como nosso patrões fazem conosco cotidianamente.
Quarto, sem a fadiga "desnecessária e prejudicial" dos afazeres do lar, “o macho trabalhador” pode usar toda a sua força física e mental na execução das tarefas específicas para qual foi “destinado” por sua condição de classe sexual e econômica. Com a plenitude de suas forças, o trabalhador proletário poderá ser bem mais explorado no exercício de seu trabalho. Entretanto, este, apesar de desenvolver um trabalho alienado, ao menos desempenha uma atividade de construção e transformação material, tornando-se essencial para a sobrevivência de toda a sociedade na manipulação da natureza, e não na confirmação da animalidade/reprodução biológica, como ocorre com as fêmeas quando seu trabalho social resumisse simplesmente aos apetrechos que envolvem a sua maternidade e conservação.
Quinto, desta maneira a divisão de classe sexual projeta e sustenta psicossocialmente a divisão das classes econômicas. Da autoridade marital e paterna sobre o corpo outro ao trabalho não-reprodutor, se estende e estabelece a naturalização das desiguais relações pessoais e patronais. Todas elas microreproduzidas dentro da família e solidificadas na relação de poder e propriedade entre mães e filh@s (como já dissemos aqui no texto O mito da infância feliz: “as crianças são as mulheres das mulheres”³). Por estas relações, treinamos então o comportamento d@s futur@s dominador@s (homens/burgueses/branco[as]) e dominad@s (mulheres/proletários/negros[as]).É na primeira experiência de diferenciação de classe sexual, a infância, no momento em que vê a mulher/mãe ser explorada em nome do ócio do “chefe da casa”, que as crianças projetam como “naturais” também as diferenciações de ordem econômica. Presa a animalidade original de nossa condição biológica, jamais as fêmeas serão alçadas a condição de sujeito da transformação material humana. Tanto que nas residências em que mulheres e homens trabalham, é comum que “a renda feminina” seja apenas “complementar” a renda masculina (venda de bijoterias, quitutes, perfumaria,professora de "reforço escolar", etc), para que ela possa apenas auxiliar no pagamento das contas e possa ter dinheiro/independência para comprar “suas coisinhas”, dando-lhe o tempo necessário para os afazeres domésticos tão “antimasculinos”. E quando seu status financeiro é equivalente ao do macho, não é nada incomum que apesar de desenvolver atividades externas, a mulher seja cobrada/deseje engravidar e passe a assumir uma quádrupla jornada de trabalho (emprego, mãe, dona de casa e objeto da satisfação/masturbação sexual do marido).
Quinto, desta maneira a divisão de classe sexual projeta e sustenta psicossocialmente a divisão das classes econômicas. Da autoridade marital e paterna sobre o corpo outro ao trabalho não-reprodutor, se estende e estabelece a naturalização das desiguais relações pessoais e patronais. Todas elas microreproduzidas dentro da família e solidificadas na relação de poder e propriedade entre mães e filh@s (como já dissemos aqui no texto O mito da infância feliz: “as crianças são as mulheres das mulheres”³). Por estas relações, treinamos então o comportamento d@s futur@s dominador@s (homens/burgueses/branco[as]) e dominad@s (mulheres/proletários/negros[as]).É na primeira experiência de diferenciação de classe sexual, a infância, no momento em que vê a mulher/mãe ser explorada em nome do ócio do “chefe da casa”, que as crianças projetam como “naturais” também as diferenciações de ordem econômica. Presa a animalidade original de nossa condição biológica, jamais as fêmeas serão alçadas a condição de sujeito da transformação material humana. Tanto que nas residências em que mulheres e homens trabalham, é comum que “a renda feminina” seja apenas “complementar” a renda masculina (venda de bijoterias, quitutes, perfumaria,professora de "reforço escolar", etc), para que ela possa apenas auxiliar no pagamento das contas e possa ter dinheiro/independência para comprar “suas coisinhas”, dando-lhe o tempo necessário para os afazeres domésticos tão “antimasculinos”. E quando seu status financeiro é equivalente ao do macho, não é nada incomum que apesar de desenvolver atividades externas, a mulher seja cobrada/deseje engravidar e passe a assumir uma quádrupla jornada de trabalho (emprego, mãe, dona de casa e objeto da satisfação/masturbação sexual do marido).
Ana Clara Marques e Patrick Monteiro
OBS: na próximo texto desta coluna, aprofundaremos a questão do trabalho e da filosofia capitalista como forma de ideologia da maternidade
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¹- De acordo com Humphrey Institute of Public Affairs, da universidade estado de Minnesota (WOLF, Naomi: O mito da beleza), apesar de mais de sermos 50% da população e ocuparmos dois terços das horas trabalhadas, somos donas de menos de 1% das grandes propriedades capitalistas. Em seu primeiro encontro com as militantes do Movimento de Libertação das Mulheres, Simone de Beauvoir levantou uma questão da qual ela mesma afirmou não saber a resposta (“Como, segundo vocês, se articulam exatamente a opressão patriarcal e capitalista?”); uma afirmação, conseqüente desta mesma questão, foi sentenciava por Beauvoir : “toda a tática que as mulheres devem seguir, depende disso (desta resposta)”. Sua preocupação mostrou-se legitima, pois segundo ela, para não se estagnar, o feminismo após as conquistas da década de 1960, deveria estudar o papel das mulheres dentro das relações de exploração capitalistas. Assim, o nosso foco se voltou sobre a principal função social feminina: a maternidade e sobre a sua importância para conservação das relações de desigualdade econômica e sexual entre fêmeas e machos de nossa espécie.
²-Para entender o significado de "MATERNIDADE INTENSIVA" acesse: http://sexismoemisoginia.blogspot.com/2010/02/maternidade-intensiva-um-ideal-que-nao.html
³-http://nucleogenerosb.blogspot.com/2009/08/o-mito-da-infancia-feliz.html
Um comentário:
No primeiro momento de engajamento, temos que conscientizar, temos que "compartilhar"; precisamos divulgar, usar as mídias e as telecomunicações como formas de demonstrar a opressão. Maçãs Podres é um engajamento, é uma luta contra a opressão. Participemos, reflitamos, conversemos com cada um que pudermos; ou do contrário, seremos omissos.
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