A "SANTA" E A "PUTA"
Em qualquer sociedade machista de moral dupla, os arquétipos femininos de "santa-puta" só são permitidos de se complementarem em uma só mulher, se esta mesma mulher pertencer a um mesmo homem, quem nunca ouviu: "santa na rua, puta na cama". Puta dele. É por tal motivo que é comum que se uma mulher assume o arquétipo da "santa" ela acaba por recriminar qualquer outra mulher que exercite um comportamento libertário e sexual. O arquétipo da "santa mamãezinha" é atrelado a visão machista de que a mulher é "boa-moça, honesta e bem comportada", ou seja, uma mulher assexuada e passiva, obediente ao seu namorado/marido, pai ou filho. Seguir o arquétipo da "puta" seria libertador se não afirma-se a lógica de uma sociedade patriarcal, pois a sexualidade é uma libertação do corpo, mas a nossa "liberdade sexual" incluída dentro deste padrão, tem a função de aumentar o mercado de consumo sexual masculino. Eis a faca de dois gumes: de um modo ou de outro podemos nos tornar objeto do consumo masculino: se "santas" somos consideradas um "bem de consumo durável", se "putas" somos vistas como um "bem de consumo descartável". A única saida é uma atuação política e existencial capaz de questionar estes valores e redimensiona-los para os interesses feministas. Mas qual é o intuito da mídia em reafrimar os arquetipos além de desunir as mulheres?
A SOCIEDADE DOS SONHOS PROGRAMADOS
As representações dos arquétipos femininos e masculinos podem ser considerados como “a projeção dos sonhos de uma sociedade”. Se tal teoria estiver certa, o desejo social nasce do inconsciente coletivo e influência o comportamento das pessoas. Então estas projeções difundidas poderiam ter o poder de manipular comportamentos e torná-los mais, digamos, previsíveis. Apesar de não acreditarmos em determinismo ou em pré-determinismos religiosos, o conceito de vivermos numa “Matrix” parece ter algum fundamento partindo deste pressuposto. Parece absurdo? Para nós também seria. Mas será que as pessoas poderiam ter imagens emocionais de si mesmas que neguem a sua própria "imagem", a ponto de defenderem os interesses de seus opressores, ou seja, reproduzirem a ótica de bom e mau, de feio e bonito, tristeza e alegria? Será que o investimento em bonecas, personagens de filmes e novelas, literatura romântica, etc., teriam o objetivo de confirmar tais teorias psicossociais capaz de manipular e prever o comportamento humano? Ou os estudos da influência dos arquétipos são tão estimulados apenas porque quem tem grana deseja promover o conhecimento desinteressado da humanidade? Será apenas que o único e exclusivo motivo para a reafirmação destes arquétipos é o retorno monetário das megacorporações? Esses personagens dos arquétipos humanos são tão impressionantemente e constantes através dos tempos, nas mais variadas culturas, que nos diferentes sonhos e nas diversas personalidades dos indivíduos encontram representações semelhantes nas estruturas patriarcais do mundo inteiro. Coincidência? Talvez.
A PSICANÁLISE A NOSSO FAVOR
Mas se forem verdadeiras algumas das sugestões teóricas de Carl Jung, dominar o conhecimento desses arquétipos dará ao a quem tenha o controle sobre a grande mídia um poder tão grande quanto a ideia do Deus cristão. Lógico que como na mitologia religiosa judaico-cristã, quem sabe nós teriamos o "livre-arbítrio" de nos submeter ou desmembramos dos comportamentos comuns a estes arquétipos? Mas, no mínimo, estas imagens, ideias e projeções podem ser ferramentas úteis para a manipulação de pessoas que se sintam seduzidas pela admiração ingênua e fascino. Na nossa visão tudo é intencional e não existe nenhuma inocência quando o interesse é manter pessoas acorrentadas pela cegueira ou destruir com tais cadeias. Mas o quê será que muitos destes arquétipos podem despertar em uma criança que esteja ainda em processo de formação de sua personalidade? Vivemos a teocracia dos mitos do cinema, oramos para a constelação dos astros e estrelas da música, vivenciamos a adoração iconoclasta das bonecas “barbies” e a transformação do sangue em silicone, nos convertemos aos milagres televisivos, seguimos a bíblia da moda e comungamos nos templos religiosos dos shopping-centers. Será que tudo isso acontece atoa? Seria simples "teoria de conspiração" ou uma singela coincidência? Quem sabe? Sabemos apenas que os machistas fazem de tudo para não perderem seus privilegios sociais. Resumindo: não temos muito a perder e temos tudo a ganhar. Somos brutalmente agredidas lutando. E se já fomos brutalmente agredidas quando estavamos caladas, só existem razões para lutar.
POR QUE MAIS UM MINUTO DE SILÊNCIO?
Mas eis então uma das principais intenções do Núcleo de Estudo de Gênero Simone de Beauvoir: quebrar com toda e qualquer ideia contrária a emancipação feminina dos grilhões visíveis até as invisíveis correntes dos arquétipos femininos e humanos, tidos como naturais e que nos tornam rivais. Cada imagem para este texto foi cuidadosamente escolhida e é propositalmente chocante e impregnada de uma violência psicológica desumana. Entretanto não são nada comparadas ao estupro psicológico que sofremos desde a infância. Uma violência capaz de nos criar angústias emocionais tão profundas a ponto de marcar nosso comportamento para toda uma vida. Comportamentos que fazem com que muitas mulheres sintam-se culpadas psicologicamente por sentirem desejo sexual. Por não concretizarem seus anseios, tais mulheres são usadas para reprimir a liberdade de outras mulheres. Ou por terem sido criadas para serem incapazes de tomar decisões e compreenderem que os valores como o casamento, a monogamia cega, a vontade de ser mãe são estímulos impostos desde o ventre materno. Estímulos que influenciam em nosso destino já na escolha a delicada cor “rosa”. Eis o motivo de ser "feminina" é ser pessoas mais dóceis. Sim, somos violentadas diariamente e não existe outro modo de se reconhecer à opressão se não for encarando-a de frente. Ao se perguntarem se “tais imagens escolhidas são de 'mal-gosto'?” Responderiamos que sim. São imagens assassinas. Imagens que trazem em si o poder do apodrecimento de uma essência feminina. Matem a "boa-moça" de seu ser. Não acreditamos em nenhuma "natureza feminina”, pois não nascemos mulheres, mulheres nós nos tornamos e esta é a diferença: qual o tipo de mulher que você quer ser? Esperamos que TODAS sejam MAÇAS PODRES!
Mas você não acredita em nada disso?
Assista o vídeo e tire suas próprias conclusões.
Texto: Patrick Monteiro
Um comentário:
Concordo quanto à questão de a mulher ser considerada uma boneca pelo homem e que a luta pela emancipação feminina deve acontecer a partir do momento em que o regime de escravidão imposto pelo machismo é perceptível. E isso é variável, de caso para caso. Mas não podemos negar que é um tanto radical a opinião de que a vaidade está relacionada à futilidade feminina. Conheço mulheres belíssimas e vaidosas que são guerreiras e independentes, que não se deixam persuadir por homens que desejam trancá-las na torre do castelo. Não quero conceder a hipótese de mudar minha própria aparência de forma tão radical, apesar de ovacionar muitos dos conceitos descritos neste blog.
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