(Este texto é a conclusão da série "Liberdade Sexual, Pornografia e Feminismo" e "A história de Linda Susan Boreman - De atriz pornô a militante feminista")
Avisamos que é preciso que você leitora Maçã Podre se prepare psicologicamente para o que irá se dispor a assistir ao clicar na imagem do Pornoterrorismo, o que verá será de sua inteira responsabilidade, pois ela a levará diretamente para um dos polêmicos vídeos performances das pornôterroristas. Entretanto, é nossa função dizer que se o corpo está "coisificado" nas apresentações pornoterroristas é por causa do patriarcado coisificar todos os corpos. No que poderão ver, mesmo havendo uma profissionalização d@s artistas, não há prostituição instituída, como na pornografia, e não há produção massificada da manifestação sexual, o que conceitualmente define a indústria pornográfica. E o mais importante é que as interventoras/es se apresentam como elaboradoras/es e sujeitos de sua atuação e não objetos de simples manipulação passiva dos desejos sexuais de outros (regra estética básica para a definição de arte feminista). Concordem ou não, existir lá um discurso conceitual e teórico contra a opressão sexual de cunho insurrecional. Se é ou não uma arte libertadora, deixamos pra que outras feministas decidam. Assistam:
(obs: Pelos mesmo motivos do primeiro estudo sobre pornografia, só deverão ler a conclusão as pessoas que forem maiores de 18 anos ou feministas, pois algumas imagens mostradas a seguir são explícitas.)
O manifesto feminista do Pornoterrorismo
Pornoterrorismo |
Para a conclusão, vamos apenas apresentar o fato óbvio e deixar que cada leitora maçã podre defina a sua opinião estética e feminista sobre o Pornoterrorismo, sem oposição. Só não podemos negar que a maneira com a performance é apresentada é obscena, o que nos leva as seguintes perguntas: existe um limite que diferencia arte “obscena” de pornografia, será que o feminismo radical se coloca no campo moralista quando deflagra uma luta contra a pornografia?
Antipornografia é um moralismo?
Para que as nuancias da explicação que se seguirá sejam assimiladas, basta que a leitora imagine a pornografia industrial como "um relógio" que marca "as horas sexuais", assim fica mais fácil de entender os diferentes discurso ideológicos contra ou a favor da pornografia.
O “liberalismo pós-feminista” defende a “desconstrução” do relógio/pornografia e uma reforma nas estruturas da fábrica que o produz. O objetivo é criar modelos femininos do produto e colocar mulheres nos cargos de supervisão/chefia da linha de produção. Consta no discurso liberal pós-feminista que no relógio/pornografia se pode ver as horas/sexo o que garante a liberdade (sexual).
O feminismo radical luta para destruir o relógio/pornografia e também sua fábrica. O objetivo é que mostrar que as horas/sexualidade são uma invenção humana, pois não passam de uma mecanização do tempo/sexo. O discurso feminista radical avalia que se utilizarmos as mesmas peças para reconstruir "novos relógios", não mudaremos a mecânica de seu funcionamento.
O centro das divergências está na "desconstrução" ou na destruição do(s) relógio(s). Eis a diferença filosófica entre moral e ética.
Toda e qualquer visão que aproxime o feminismo radical do discurso moralista é uma visão limitada e reducionista da questão, quando não mal-intencionada. Desta maneira, diferente dos religiosos, as feministas radicais não pretendem "censurar a liberdade sexual", mas destruir com a matéria que constrói a pornografia. . Nosso ataque é ao patriarcado e sua produção. Quando a luta do feminismo radical se direciona a pornografia é por esta ser uma expressão da sexualidade reprimida, das relações desiguais de classe econômica e de genêro, todas existentes no patriarcado. A ponografia não é a causa, mas a consequência desta construção. Ou seja:...para as feministas radicais a questão não é moral, o cerne é ético e revolucionário.
A pornografia existe e foi originalmente produzida para (os homens) aliviar as pressões sexuais impostas dentro do machismo. É um alivio artificial que visa conservar as representações, identidades e relações estruturais de gênero, reprimidas pela moral machista. Enquanto liberarais desejam lucar com a sexualidade padronizada, desde que seja exercitada de modo privado e coisificado, o feminismo radical visa mudar o modo que os olhos humanos entendem a sexualidade, destruindo-a e ao padrão imposto e massificado das normatividades sexuais, para possibilitar a construição de outra realidade sexual, individual e coletiva, livre de determinações de gênero. Eis o motivo de nosso ataque as infra-estruturas e superestruturas do capitalismo.
O maior problema no momento é que com a onda "pós-feminista", colocou na cabeça das mulheres liberais um permissivismo com a exploração sexual dos corpos/pornografia, resíduo do neoliberalismo econômico. E muitas vezes, o fato também ocorre por pura confusão e equívoco histórico de quem associou a liberdade sexual com o fim da censura militar.
Para que seja possível identificar diferenciações entre erotismo e pornografia vejam este vídeo-teste abaixo. Assim que assitirem o vídeo, seria interessante que as leitoras, que não leram a primeira série de estudos sobre a pornografia, classificassem as imagens vistas como pornográficas, eróticas ou obscenas, antes de continuarem a leitura.
Diferenças entre obscenidade, erotismo e pornografia
Buscamos apresentar explicações bem consensuais entre os três termos “obsceno” (contrário à decência moral ou ao pudor), “erotismo” (relativo ao amor, que desperta desejo físico) e “pornografia” (escritos que dizem respeito a prostituição ou representação de práticas sexuais produzidas industrialmente) para elucubramos nossas colocações.
Em primeiro lugar, em sua forma moderna, como fenômeno de massa, o erotismo relaciona-se com o surgimento da imprensa, onde o sexo possuía toques platônicos. Existem vários livros que aprofundam seus aspectos artísticos e culturais, o que colocaremos em questão é que o erotismo normalmente representa o limite socialmente permitido para expor as representações sexuais ou exposições do corpo.
Na figura da mulher o erotismo comumente expõem as genitais. Na figura masculina a proibição erótica é maior. No erotismo, como imagem, os corpos masculinos, em especial, e femininos menos, tendem normalmente a serem apresentados de modo coisficado e em fragmentados. A bunda dele, o tórax dele, elas em posições púdicas e etc. O mais importante é que existe uma busca homérica para reproduzir nas imagens "eróticas" os padrões de beleza vigentes, como por exemplo a Vénus adormecida (1510) de Giorgione. Na época da pintura exemplificada, os padrões de beleza estética feminina definiam como belas as "gordurinhas localizadas".
Em segundo lugar, a pornografia representa um desenvolvimento da publicação da imagem erótica. O que antes era simulado ou coberto passa a ser exposto. Criam-se os operários do sexo, a mão de obra explorada, e o corpo da mulher passa a ser um mero veículo para a comunicação de classe sexual dos machos.
Com a massificação do sexo explícito, imagens que antes eram consideradas pornográficas passam definidas como “éroticas” por erro histórico, como é possível avaliar no vídeo-teste acima (lá todas as imagens datam de 1860 a 1900, e segundo os registros, as "modelos" eram comumente prostitutas). Compreender que na pornografia, em geral, a mulher é apenas um veículo com o qual os homens intermediam suas relações de poder e prazer, é reconhecer o que Marx definiria como a mulher fazendo a função de moeda de troca entre os homens. Esta afirmação é possível de ser observada no "controvertido" The Kiss (1900), considerado "o primeiro filme pornográfico público" de sua época.
Terceiro, o que é determinado como obsceno não necessariamente se define pela nudez ou exposição do corpo. Qualquer coisa que deva ser colocada fora de cena, “não deva ser dita ou mostrada” é considerada obscenidade. Um exemplo eram peças teatrais que continham palavrões contra a fé e a religião. Outro, são os textos de Nelson Rodrigues que atacava as normas morais da família brasileira.
Uma boa medida
Mas se existe no material uma exploração da "mão de obra sexual" é pornografia. Se uma imagem visa ser vendida e coisifica o corpo humano através de padrões de beleza, mesmo que não exponha as genitais ou mostre sexo explícito (o que define o "erótico"), é uma exploração sexual sim, pois se apropria do corpo do outro e cria uma ideologia que conserva os valores morais e padrões de beleza vigentes.
Podemos dizer então que a diferença entre a pornografia e o erotismo é que a primeira é uma grande indústria sexual e a segunda é uma exploração sexual "pequeno burguesa".
Agora se uma mídia de dois casais transando (por vontade e conhecimento de todos), seja qualquer orientação, é divulgada a público por estes num site/mídia, sem associação comercial, só podemos definí-la como obscena. O que necessariamente não exclui a possível existência de um conteúdo machista dentro do material.
Texto: Ana Clara Marques e Patrick Monteiro
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1000 NUDEZ- A history of erotic phography from 1839-1939; Uwe Scheid Collection,
O que é amor, erotismo e pornografia; Betty Milan, Lúcia C. Branco, Eliane Moraes e Sandra Lapeiz
E as demais fontes citadas nas séries de pornografia.
1000 NUDEZ- A history of erotic phography from 1839-1939; Uwe Scheid Collection,
O que é amor, erotismo e pornografia; Betty Milan, Lúcia C. Branco, Eliane Moraes e Sandra Lapeiz
E as demais fontes citadas nas séries de pornografia.
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