O programa Profissão Repórter, apresentado por Caco Barcellos na Rede Globo, exibiu na terça-feira uma reportagem sobre “Concursos de Beleza”. Apesar de o tema ter uma aparência banal e o programa simular um perfil “sério e intelectualizado”, nós maçãs podres sabemos que as aparências enganam. O tema não é banal, pois reflete estereótipos do senso comum imposto as mulheres. Em nada a imbecilidade de tal programa pode ser definida como intelectual, já que reforça, em todos os sentidos, os mais antigos preconceitos de gênero, raça e classe comuns na sociedade brasileira. Contudo sabemos que tudo no "sério" jornalismo Global é bem planejado. De um lado, um concurso com o nome “Garota da Laje”. Mulheres negras e pobres da periferia, que na matéria mostram seus “dotes”. Elas “possuem” uma sexualidade animalesca, com curvas extremamente avantajadas, estilo “bad girls”. Seios fartos, algumas nem tanto (afinal elas são pobres e não tem dinheiro para “recauchutar”). A bunda grande e redonda como uma bola de futebol, mostrando para que serve a “mulata brasileira”. Elas utilizam um “dialeto” todo sexual e “vulgar”. Roupas que mostravam como cada parte de seu corpo é importante para atrair os possíveis “consumidores”. Elas seriam objetos a serem apreciados e em seguida devorados? É a moda das mulheres-fruta. O investimento: o menor biquíni possível, uma laje e suco de cenoura com beterraba para manter o bronzeado.
Do outro lado, as mulheres do sul se dirigiam, em seus carros usados e coletivos, ao “Concurso de Prendas”. Estas são as mulheres brancas de "classe média". Elas se vestem com roupas típicas, vestidos longos cobrindo-lhes o corpo todo, onde só se via a cabeça e as mãos. Usavam penteados tradicionais, impossíveis de se fazer sozinha. Representavam os dotes e valores da cultura sulista. Elas cantam, leem poesias, bordam. Femininas, tinham todo um projeto “individual” pra que cada prenda se apresentassem, como num baile de debutante. São as bonequinhas de porcelana que enfeitam as lareiras de nossas fazendas familiares. Investimento: maior vestido possível, um salão e nenhuma tinta no cabelo para confirmar o louro de seu sucesso.
A PODRE ANÁLISE DAS MAÇÃS PODRES:
Vemos aqui Os Estereótipos da Santa e da Puta publicados em nosso blog -http://nucleogenerosb.blogspot.com/2009/01/os-arqutipos-femininos-e-masculinos-i.html e http://nucleogenerosb.blogspot.com/2009/01/os-arquetipos-femininos-e-masculinos-ii.html, dividindo as mulheres em dois papéis ambíguos.
As mulheres brancas foram caracterizadas como “as moças de família”, sempre acompanhadas pelos seus parentes orgulhosos de suas qualidades. O concurso ocorria dentro de um espaço privado. E respeitava a moral e os bons costumes.
As mulheres negras foram mostradas num concurso de rua, semi-nuas e expostas a observação pública masculina. A explicação para um concurso "tão revolucionario', foi "a desigualdade e injustiça social que elas sofriam excluindo-as das praias cariocas. O que caracteriza-as como “mulheres de vida difícil”.
Moral da historia: as “garotas da laje” foram feitas para trepar e as “prendas” treinadas para casarem e tornarem-se educadas mães.
Também ficou nítido todo um preconceito de classe e raça, no momento em que a reportagem afirmou que não era necessário para “a eleição das prendas”, o “critério beleza”. O conhecimento da cultura sulista era mais importante. Assim, dois pontos de preconceito foram expostos pela Rede Globo, confirmando os valores sociais que tal instrumento de mídia defende: o primeiro, o conhecimento cultural agrega as mulheres brancas maior valor de mercado, sendo elas “naturalmente bonitas” (dentro do padrão estético racista); o segundo, é que por não possuírem um conhecimento erudito, sobra as mulheres negras a função de objeto vulgar da sexualidade masculina. Por tal motivo elas se expressam com o tão peculiar dialeto da periferia.
Apesar da função primordial de tal programa ser o de diferenciar “os tipos de mulheres de nossa sociedade”, outra questão de fundamental importância é o enfoque dando a "Rivalidade Feminina", da qual já publicamos um texto - http://nucleogenerosb.blogspot.com/2009/01/o-mito-da-rivalidade-feminina_03.html.
Após a eleição do “Concurso da Garota da Laje”, uma mulher negra e fora do padrão “mulata de traços delicados”, mostrou todo seu "olhar de inveja" contra as demais candidatas eleitas, "menos bonitas" que ela. A intenção era confirmar o mito da desunião feminina, algo que não aconteceu no educado pólo oposto, pois "todas as minhas amigas venceram”, disse uma das prendas escolhidas.
Dois detalhes interessantes que destacamos desta parte, foi que a frase dita pela jovem mulher, cantora de funk, quando questionava a legitimidade do concurso da laje, algo do tipo: “pra que eu quero um carros usado, se eu tenho um carro novo?”, tinha como cenário de fundo, uma placa escrita: “sanitário”. E o outro foi que uma das garotas da laje escolhida, se afirmou "bailarinha" - sonho infantil das meninas de classe média brancas - gerando uma pergunta "inocente" do Caco Barcelos: "o que seu público gostava de ver?" e ela respondeu: "a bunda". Determinado, sutilmente, o tipo de público que consome e assiste o seu "elegante balé clássico" nos dias atuais.
Para finalizar, dedicamos especial atenção ao concurso de beleza mirim.
Como foi exposto no texto: “Pedofilia, Publicidade e Machismo”-http://nucleogenerosb.blogspot.com/2009/06/pedofilia-e-machismo.html, uma das funções dos programas e comerciais de TV é lançar no consciente coletivo um projeto de futuro que vem a garantir a manutenção do projeto social machista. Desta maneira, dentro programa Profissão Repórter, um bando de "menininhas de olhos azuis de boneca e vestidas como princesinhas Barbie" foram mostradas como proposta infantil das “mulheres prenda”.
O concurso destas crianças exalta a prática reacionária e nostálgica dos intragáveis concursos de miss do passado. O concurso de “miss infantil” - de meninas, é claro – é mostrado pelo programa de forma aparentemente “crítica”. Mas as aparências enganam. Nele, todas as meninas eram “forçadas”, por suas mães frustradas, a uma disputa irracional e desumana. Por não terem conseguido ser miss, as mães obrigavam as filhas a se comportarem como mini madames de luxo. Estas crianças articulavam as palavras muito bem e eram obrigadas a parecerem simpáticas, com sorrisos forçados, maquiagem, cabelo com penteados arcaicos e de botas. Todas usavam uma faixa com o nome da cidade.
Seria muito "interessante" se o programa tivesse o objetivo de mostrar o quanto era ridícula tal situação, mas sabemos que a Globo em nada quer acabar com a alienação do seu público. Ao final, a criança que foi mostrada sendo torturada por sua mãe, teve seu "esforço" recompensado com um "terceiro lugar", já que o primeiro lugar lhe pertence no futuro. Então, não há nada melhor para um conto de fadas que um final feliz.
Ou seja, para os homens da mídia, quanto mais mulheres – sejam pobres ou não, brancas e negras, adultas ou crianças -acreditarem que ser "objeto" é a única forma que tem de “subir” na vida, melhor (é a dominação).
O real objetivo de tais programas é confirmar o senso comum de que todas as mulheres são “iguais”. No sentido de quererem a mesma coisa: serem cultuadas e cobiçadas pelos homens, tornado-se assim, instrumentos das vontades masculinas. E o que fica na cabeça dos telespectadores é o preconceituoso senso comum de que "a branca é branca; a negra é negra; sexo é na rua; casamento é em casa; e todas as mulheres, no fundo, sejam adultas ou crianças, são todas iguais".
E entre um comercial e outro, os patrocinadores da Rede Globo de Televisão agradecem.
Texto: Ana Clara Marques e Patrick Monteiro
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Para uma melhor análise assistam o programa:
2 comentários:
Eu não vi o programa em causa pois já não tenho pachorra para essas porno-chachadas, mas percebo bem o efeito pernicioso que ele pode ter nos espectadores/as que acriticamente assistem. Só me pergunto se no Brasil não existe nenhum movimento feminista organizado capaz de tomar posição pública perante o assunto. Artigos como os do V. blog , do meu e de outros similares têm um impacto extremamente reduzido e era necessário começar a chegar a um público mais vasto. Na Europa este tipo de programas já não passa tâo pacificamente, sobretudo o referente às pequenas miss que constitue autêntica intoxicação mental.
Abraço, adília
É...eu também fico me perguntando isso.É angustiante ver como o feminismo se dispersou em manifestações festivas como vocês mesmas colocaram(hehehe muito legal XD!)num texto e em discursos pós-modernos do tipo "cada um sabe de si" e "tudo é escolha".Então,não é de se admirar,mas nunca de se conformar,que o movimento feminista autêntico fique com atuação tão reduzida.
E respondendo: Não Adilia,não existe infelizmente...porque coisas deste tipo são consideradas "liberdade de expressão".Quando reclamei de propagandas para o CEDIM,o que me responderam é que "estamos numa democracia".Aí nos leva a outra pergunta: se os orgãos que supostamente eram para nos defender tem esta atitude,o que nos resta então?
Mais uma vez,os patriarcas agradecem e muito..viva a "liberdade de expressão democrática" do Brasil!! afee...
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